“Apenas os pequenos segredos precisam ser guardados, os grandes ninguém acredita” (H. Marshall)

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A utopia de Arjuna: o desafio do discípulo


“Ó nobre príncipe, há dois caminhos que levam à Perfeição. O primeiro é o caminho do Conhecimento, e o segundo é o da Ação. Uns preferem o primeiro, e outros, o segundo desses caminhos; sabe porém que, considerados superiormente, ambos são um só caminho.” (Bhagavad Gita, III,3)

Arjuna é o protótipo do discípulo, tanto que o seu nome contém a palavra “arya”, a raça a qual Krishna veio abrir. A saga destes dois personagens, mestre e discípulo, está escrita no Bhagavad Gita, “A Sublime Canção”.
Aryuna significa “prateado”, o “Homem Argênteo” é o nobre ou o aristocrata, o guerreiro preposto da Idade de Prata, o que determinou também a cultura dominante do ciclo áryo.
Eis que o avatar Krishna identifica uma situação didática, naquilo que seria a grande prova do aspirante à iniciação árya, na superação do separatismo, do ego ou das emoções pessoais.
Mais que um homem de uma raça ou Idade mundial, ele é esotericamente falando o “candidato a iniciado”, que busca meditar, refletir, estudar e informar-se.
Como guerreiro espiritual ou iogue, é um idealista cultor de “paz e amor”. Não quer agredir ninguém e nem ser agredido, em pensamentos, sentimentos e ações.
Contudo, possui pensamento crítico e tem idéias para si e os outros. Busca um ideal de vida e, de maneira inconsciente, sente-se uma espécie de modelo social. Deseja que todos sigam os seus passos ou aquilo que ele almeja para si mesmo.
Por isto, Arjuna sabe que deve encarar algumas batalhas na vida, a militância é necessária, ele não quer ser um omisso e um alienado, cabe fazer a sua parte e deixar a sua pegada na História.
E foi numa ocasião destas que, ao se deparar com seus adversários, encontrou vários parentes seus e hesitou em dar prosseguimento no seu objetivo.
Arjuna lutava para não ver o inimigo dentro de si, purificando-se continuamente. Mas subitamente ele vê a si no inimigo, ao perceber no “espelho-do-outro” que o inimigo carrega muito dele próprio. Então, por um momento ele descobre que as diferenças nem são assim tão grandes.
Arjuna é levado a conhecer os seus apegos e a identificar o relativismo das coisas. Eis que o seu maniqueísmo inconsciente que o fazia ver-se com um modelo capaz de criticar o outro, começa a cair por terra.
Ele sente-se perdido, quer compactuar, relativizar, “harmonizar”, titubeia porque ali ele perde o foco. A sua parte menor e pessoal ameaça tomar a dianteira.
Neste momento aparece o seu mestre Krishna, até então disfarçado de cocheiro, dizendo-lhe que deve persistir na sua sina original, e seguir o seu verdadeiro coração, porque ali é que estava a verdade maior, não deveria se deixar levar pelos sentimentos pessoais.
Arjuna deve obedecer o seu próprio dharma ou dever, para cumprir aquilo que o universo espera dele e assim realizar a sua Alma.
Para alcançar isto, Arjuna deve praticar o Karma Yoga, que é agir sem se apegar aos frutos das suas ações.
Existe um Plano maior a ser seguindo, um plano no qual ele é um com todos numa esfera maior, independente de identificações imediatas.
Este Plano não está escrito nos seus desejos. Está na sua Alma mais profunda, e se revela nos saberes dos iluminados.
Como dizem os Salmos, “os caminhos do homem a Deus pertencem”. O homem tem os seus sonhos e desejos, muitas vezes dignos e razoáveis, mas a forma de alcançá-los já é um outro assunto.
Se ele quer guiar a si mesmo na empreitada, nunca terá sucesso, porque o inimigo está dentro dele e o espreita a cada passo, por menos que deseje ou alcance ver isto.
Fascinado pelas próprias idéias e, narcisisticamente, por si mesmo, mal percebe como segue o “caminho da visão” e não o “caminho do coração”.
É a prova da “visão clara”, que os toltecas afirmam ser o “segundo inimigo do homem de conhecimento”, a qual ata o buscador em seus próprios conceitos. Tal coisa esta explícita na passagem dos ensinamentos de Krishna citado no início deste texto: desde uma visão superior, os caminhos do Conhecimento e da Ação são um só.
Assim, o dilema de Arjuna, que é o de todo o discípulo, é aquele de supervalorizar o conhecimento pessoal em detrimento de um plano-de-ação de maior comprometimento e alcance, limitando-se a uma visão algo sectária e reduzida. Só a visão maior do mestre é que pode libertá-lo nesta altura.
Eis que a sua sonhada “linha reta” de salvação, é apenas uma utopia pessoal, ela abrange apenas ele mesmo ou alguns poucos afins, e “uma só andorinha não faz verão”.
Este “bem-intencionado” (dos quais, segundo dizem, o inferno está cheio) mal imagina que alimenta uma atitude burguesa, individualista. É o idealista que se contenta em “fazer a sua parte” e o ecologista que constrói a sua “ecovila” feliz, ignorando o quanto a sua “micropolítica” ainda é elitista em suas atitudes isoladas de alcance menor, sem alcançar efeito maior no todo. Quase podemos comparar esta postura à ação de uma droga que aliena e ilude.
Para sair disto, ele dele enfrentar as suas atitudes de sectarismo, fanatismo, individualismo, elitismo e preconceito pessoal, e ao fazê-lo inevitavelmente alcançará sínteses e retomará uma esfera de tradição.
O sucesso dependerá de alcançar tecer uma hipérbole, abranger novos cursos, misturar os tempos; terá que fazer novas concessões, sínteses serão apresentadas, e ele se deparará com os seus próprios preconceitos...
Descobrirá por fim, consternado, que por mais que tenha caminhado e esteja avançado diante dos outros homens, ante de Deus ele ainda é um aprendiz. O desafio do discípulo, está em enfrentar o próprio ego e reconhecer que as suas visões ainda são limitadas.
Então, dependerá apenas do seu próprio coração, estacionar ou seguir evoluindo. Isto pode incluir conhecer novas técnicas espirituais, que não se acham nas informações “de varejo” e podem demandar pesquisa profunda e até integrar uma cadeia iniciática, fazer esforços e encarar desafios de criatividade.
É enfim, abrir mão da sua pequena utopia pessoal, e seguir um Plano no qual ele alcançará realizações maiores que lhe permitirão ter um papel realmente importante no concerto geral das coisas, como um verdadeiro iniciado, um Guerreiro de Deus.

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